Associações criticam decisão do STJD e apontam desproporção

A punição imposta pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) aos árbitros Ramon Abatti Abel e Ilbert Estevam da Silva desencadeou forte reação das entidades que representam a arbitragem brasileira. Ambos foram suspensos por 40 dias após análises do tribunal sobre o clássico entre São Paulo e Palmeiras, no qual Abatti atuou como árbitro principal e Ilbert foi responsável pelo VAR. As associações classificaram o julgamento como desequilibrado e incoerente com o tratamento dado a dirigentes que também se manifestaram sobre o jogo.

Segundo a decisão do tribunal, a dupla deveria ser punida por não ter marcado pênalti de Allan, do Palmeiras, em Tapia, do São Paulo, quando o Tricolor vencia por 2 a 0. Embora o São Paulo tenha perdido por 3 a 2, o STJD considerou que o erro teve impacto técnico relevante. Outras ações também foram avaliadas, como uma possível expulsão de Andreas Pereira por pisão em Bobadilla.

Entidades denunciam ambiente hostil e desequilíbrio disciplinar

A Abrafut afirmou que a medida contra os árbitros é incompatível com a dinâmica natural do futebol. Em nota, a entidade declarou que “é inadmissível que erros inerentes à dinâmica do jogo — passíveis de correção por meio de treinamentos, avaliações e aperfeiçoamento contínuo — resultem em punições desproporcionais, ao passo que comportamentos antidesportivos, atentatórios à ética e ao respeito institucional sejam tratados com leniência”, denunciando disparidade e prejuízo à autoridade da categoria em campo.

A ANAF também se posicionou contra o julgamento, afirmando que o tribunal ultrapassou limites ao transformar divergências interpretativas em infração disciplinar. Em sua publicação, a associação afirmou que “divergência interpretativa em lance de jogo, por mais polêmica que seja, não se confunde com violação de regra”, reforçando a necessidade de preservar a independência técnica da arbitragem e alertando para o “precedente perigoso” que a punição pode gerar.

Entidades pedem respeito ao Código e critérios iguais a todos

As duas entidades destacaram que decisões interpretativas devem ser tratadas internamente pela Comissão de Arbitragem da CBF e não pela Justiça Desportiva, ressaltando que punições desse tipo favorecem pressões externas e criam insegurança jurídica para os profissionais. Tanto ANAF quanto Abrafut reforçaram que acompanharão os desdobramentos do caso e que cobrarão rigor no cumprimento do Código Brasileiro de Justiça Desportiva em julgamentos futuros.

SP – SAO PAULO – 05/10/2025 – BRASILEIRO A 2025, SAO PAULO X PALMEIRAS – O arbitro Ramon Abatti Abel durante partida entre Sao Paulo e Palmeiras no estadio Morumbi pelo campeonato Brasileiro A 2025. Foto: Ettore Chiereguini/AGIF

A repercussão das notas evidenciou o distanciamento entre a percepção das associações e a decisão do STJD, reacendendo o debate sobre a autonomia da arbitragem e a forma como erros técnicos são avaliados no futebol brasileiro. As entidades defendem critérios disciplinados uniformes e reforçam que o respeito às regras deve ser aplicado sem exceções.

Notas das associações na íntegra

Abrafut

“A ABRAFUT manifesta profunda indignação diante da punição aplicada aos árbitros envolvidos na partida São Paulo x Palmeiras, suspensos por 40 dias por supostos erros técnicos, enquanto dirigentes que proferiram ofensas públicas e ataques diretos à honra dos profissionais receberam apenas advertências brandas. É inadmissível que erros inerentes à dinâmica do jogo — passíveis de correção por meio de treinamentos, avaliações e aperfeiçoamento contínuo — resultem em punições desproporcionais, ao passo que comportamentos antidesportivos, atentatórios à ética e ao respeito institucional sejam tratados com leniência. A disparidade no rigor das punições evidencia um tratamento injusto e desequilibrado, que expõe a arbitragem a constrangimento público e fragiliza sua autoridade em campo. Ao punir severamente árbitros por decisões interpretativas, enquanto releva ofensas proferidas por dirigentes, cria-se um ambiente hostil que ameaça a integridade do trabalho e a segurança emocional dos profissionais. A categoria reafirma seu compromisso com o futebol brasileiro, com a ética e com o constante aprimoramento técnico. Contudo, repudia veementemente qualquer julgamento seletivo, qualquer punição desproporcional e qualquer tentativa de transformar a arbitragem em bode expiatório para pressões externas. Por respeito ao esporte, à justiça e à transparência, exigimos que os critérios disciplinares sejam aplicados de forma equânime, imparcial e com o mesmo rigor para todos os envolvidos no espetáculo. A arbitragem merece respeito. E se o STJD não conhece as regras do jogo de futebol, em particular a regra 5, também merece respeito.”

ANAF

“A Associação Nacional dos Árbitros de Futebol (ANAF) manifesta sua discordância em relação à decisão do STJD que suspendeu por 40 dias o árbitro e o VAR da partida São Paulo x Palmeiras. A medida é, a nosso ver, equivocada e desproporcional. O Código Brasileiro de Justiça Desportiva é claro. A responsabilização disciplinar da arbitragem exige conduta objetivamente enquadrada em infração prevista em lei, como deixar de observar as regras da modalidade ou descumprir obrigações próprias da função. Divergência interpretativa em lance de jogo, por mais polêmica que seja, não se confunde com violação de regra. A própria Justiça Desportiva já reconheceu, em manifestações anteriores, que decisões técnicas devem ser preservadas, reservando sanções disciplinares para situações excepcionalíssimas, como erro de direito relevante, fraude, má fé ou corrupção. Punir árbitros apenas porque houve discordância posterior sobre lances de jogo fragiliza a segurança jurídica e abre um precedente perigoso para toda a categoria. Entendemos que eventuais ajustes de desempenho devam ser tratados, em primeiro plano, na esfera técnica da Comissão de Arbitragem da CBF, com análise criteriosa, formação contínua e correção de rumos quando necessário, e não por meio de decisões disciplinares que respondem ao calor do resultado e à pressão externa. A ANAF reafirma seu respeito às instituições da Justiça Desportiva, mas exige o mesmo respeito ao Código Brasileiro de Justiça Desportiva, à independência técnica da arbitragem e à dignidade dos profissionais que atuam em campo e na cabine. A entidade acompanhará de perto a defesa dos envolvidos e avaliará as medidas cabíveis para que decisões futuras observem com rigor os limites da legislação esportiva. A arbitragem brasileira merece respeito.”